Soroterapia e o uso indiscriminado de vitaminas: um alerta para a saúde pública
Entrevista com o Dr. Luiz Edson de Oliveira, professor do Inspifar, esclarece os perigos por trás da tendência que promete bem-estar instantâneo.
Nos últimos tempos, uma prática conhecida como “soroterapia” ou “soro da beleza” ganhou popularidade nas redes sociais e em clínicas de estética. Prometendo desde um “boom” na imunidade e energia até o rejuvenescimento da pele, a aplicação de coquetéis de vitaminas e minerais por via intravenosa se tornou uma tendência. Contudo, a banalização de um procedimento invasivo acende um sério alerta na comunidade de saúde, especialmente após recentes notícias de complicações graves e até óbitos associados à prática.
A promessa de um atalho para a saúde perfeita pode, na verdade, esconder riscos graves, como interações medicamentosas, sobrecarga de órgãos e intoxicações. Para aprofundar o assunto e esclarecer os principais pontos de atenção, convidamos o Dr. Luiz Edson de Oliveira, professor da Pós-Graduação do Inspifar, para uma entrevista exclusiva.

Inspifar: professor, muito se fala nos benefícios das vitaminas, mas qual o risco do excesso, especialmente com as vitaminas lipossolúveis administradas sem critério na soroterapia?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: o grande perigo reside na hipervitaminose, que é a intoxicação causada pelo excesso de vitaminas. Em especial, as vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K), por não serem facilmente eliminadas pelo corpo, acumulam-se no tecido adiposo e em órgãos vitais. Esse acúmulo pode trazer uma série de alterações deletérias para o fígado, a estrutura óssea e os rins. Os sintomas de intoxicação podem variar desde desconforto gástrico, náuseas e dores de cabeça até alterações cutâneas e danos hepáticos severos. O ideal é sempre evitar o excesso e seguir a orientação profissional.
Inspifar: nesse sentido, por que a ideia de tomar vitaminas “só por precaução” pode ser um tiro no pé?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: É importante ressaltar que, embora a suplementação possa ser usada para profilaxia ou prevenção, o problema está no uso excessivo e sem diagnóstico prévio de deficiência. Tomar vitaminas “só por via das dúvidas” pode levar a sintomas que causam alterações da função hepática e renal, além de eventos gastrointestinais. Como mencionei, as vitaminas lipossolúveis são particularmente perigosas por serem lipofílicas, permanecendo mais tempo no organismo. Para evitar esses riscos, é fundamental procurar orientação farmacêutica ou médica.
Inspifar: como as vitaminas podem gerar interações perigosas com medicamentos de uso contínuo?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: este é um ponto crítico e muitas vezes negligenciado. As vitaminas interagem com diferentes medicamentos, podendo alterar sua eficácia ou aumentar o risco de eventos adversos. Por exemplo:
- Vitamina E e Ômega 3: em altas doses, aumentam o risco de sangramento quando usados com medicamentos anticoagulantes.
- Vitamina K: pode reduzir drasticamente a ação de anticoagulantes como a varfarina.
- Vitamina D: o excesso, combinado com certos diuréticos, pode elevar os níveis de cálcio e aumentar o risco de cálculos renais.
- Vitamina C: em altas doses, pode comprometer a ação de antibióticos como a tetraciclina.
Inspifar: qual a importância dos exames laboratoriais nesse contexto?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: eles são fundamentais. É através dos exames laboratoriais que podemos verificar possíveis deficiências e, igualmente importante, excessos nutricionais. Sintomas como fadiga ou alteração da imunidade podem ter múltiplas causas. Por isso, é imprescindível que se faça a dosagem sérica antes de iniciar qualquer suplementação. Se os níveis do indivíduo estão normais, não há por que suplementar. O monitoramento regular é a chave para uma análise correta e para indicar a suplementação apenas quando ela é, de fato, necessária.
Inspifar: falando especificamente sobre anticoagulantes, quais vitaminas merecem mais atenção?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: a Vitamina K é a mais conhecida por interferir diretamente na ação da varfarina. Por isso, pacientes que usam este medicamento precisam manter um consumo consistente de alimentos ricos em vitamina K para não desestabilizar o tratamento. Além disso, a Vitamina E, em altas doses, pode aumentar o risco de sangramento quando associada a anticoagulantes.
Inspifar: existe uma relação entre o excesso de Vitamina A e a hipertensão intracraniana?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: sim, existe uma relação bem documentada. O excesso de Vitamina A e seus metabólitos (retinóides) pode levar a um quadro de hipertensão intracraniana idiopática. O mecanismo exato ainda é estudado, mas acredita-se que o uso excessivo de retinóides possa dificultar a absorção do líquido cefalorraquidiano, resultando no aumento da pressão dentro do crânio, uma condição grave que pode simular um tumor cerebral.
Inspifar: e sobre os riscos de sangramento, o que mais precisamos saber?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: além da interação da Vitamina E, vale destacar que o excesso de Vitamina D também tem sido associado a um maior risco de sangramento quando combinado com anticoagulantes. Por outro lado, a deficiência de Vitamina K é uma causa clássica de problemas de coagulação, aumentando o risco de hemorragias espontâneas. É uma balança delicada.
Inspifar: o senhor poderia comentar sobre a interação da Vitamina D com tratamentos oncológicos, como o tamoxifeno?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: a Vitamina D é lipossolúvel e desempenha um papel na regulação celular. Estudos sugerem que baixos níveis de Vitamina D podem diminuir a eficácia do tamoxifeno, um medicamento usado no tratamento de câncer de mama hormônio-sensível. Isso reforça a importância de monitorar os níveis vitamínicos em pacientes com quadros clínicos complexos, sempre com acompanhamento profissional.
Inspifar: para finalizar, quais são os principais perigos da hipervitaminose D, tão comum hoje em dia?
Dr. Luiz Edson de Oliveira: A Vitamina D em excesso pode causar hipercalcemia (níveis elevados de cálcio no sangue), levando a sintomas como náusea, fraqueza, perda de apetite e, em casos graves, insuficiência renal. Além disso, aumenta significativamente o risco de desenvolvimento de cálculo renal e pode causar alterações na pressão arterial e na massa corporal. Esses riscos são potencializados quando a ingestão é excessiva e não há acompanhamento de dosagem por exames laboratoriais.
A importância do conhecimento farmacêutico
A entrevista com o Dr. Luiz Edson de Oliveira lança um alerta sobre a distância entre a percepção popular de que “vitaminas são naturais e não fazem mal” e a realidade farmacológica de seus riscos. Nesse cenário de desinformação e tendências perigosas como a soroterapia indiscriminada, o papel do farmacêutico torna-se indispensável. Com seu conhecimento técnico-científico sobre farmacologia, interações medicamentosas e fisiologia humana, este profissional é o ponto de contato mais acessível para a população. É o farmacêutico quem pode, na prática diária, orientar sobre o uso racional de suplementos, desmistificar promessas milagrosas, indicar a necessidade de uma avaliação médica e, acima de tudo, garantir a segurança do paciente, evitando que a busca pela saúde resulte em danos, por vezes, irreversíveis.
© 2025 Inspifar | Todos os direitos reservados. A reprodução total ou parcial deste conteúdo é proibida sem autorização prévia. Entrevista realizada em 07 de setembro.
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